Nesta manhã, todos os exemplares de ‘Vingadores, a cruzada das crianças’ que estavam à venda em diferentes estandes da Bienal do Livro do Rio se esgotaram em pouco mais de meia hora.
Secretaria de Ordem Pública da Prefeitura do Rio realiza, no início da tarde desta sexta-feira (6), uma fiscalização para identificar e lacrar livros considerados “impróprios” na Bienal do Livro do Rio.
“Se ele não estiver seguindo as recomendações de estar lacrado e com a orientação quanto ao conteúdo, nós vamos apreender esse material”, informou o coronel Wolney Dias, subsecretário de operações da prefeitura do Rio.
Ainda de acordo com ele, a prefeitura tem poder de polícia para realizar fiscalização e apreensão de material que considerar inadequado.
Nesta manhã, todos os exemplares de ‘Vingadores, a cruzada das crianças’ que estavam à venda em diferentes estandes da Bienal do Livro do Rio se esgotaram em poucos minutos.
A organização da feira afirmou que às 9h39 todos os pontos que tinham o romance gráfico (do inglês graphic novel) já não tinham mais revistas.
A obra está no centro de uma polêmica. Ao longo desta semana, correntes em redes sociais reclamavam da cena, em uma das páginas, em que dois personagens masculinos se beijam.
De acordo com o inciso quatro, artigo 5º, da Constituição Federal, “é livre a manifestação do pensamento”. E segundo o inciso 9, do mesmo artigo, é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.
“A prefeitura não tem o poder de busca e apreensão. Este poder é, estritamente, do Judiciário. Desde 2011, a família homoafetiva é reconhecida. Nós sabemos disso, foi amplamente divulgado. Em 2019, a homofobia tornou-se crime, equiparado ao racismo”, Silvana do Monte Moreira, presidente da Comissão dos Direitos da Criança e do Adolescente da OAB-RJ.
A Bienal informou que os livros já estavam lacrados, como todos os livros de edição especial que veem embalados em plástico transparente. Os mesmo não ficam abertos para que o público possa “folhear”.
Na quinta (5), o prefeito Marcelo Crivella determinou “que os organizadores da Bienal recolhessem os livros com conteúdos impróprios para menores”. “Não é correto que elas tenham acesso precoce a assuntos que não estão de acordo com suas idades”, afirmou.
Em nota nesta sexta, a prefeitura afirmou que estava cumprindo o Estatuto da Criança e do Adolescente e ameaçou cassar a licença da Bienal.
“Livros assim precisam estar em um plástico preto, lacrado, avisando o conteúdo”, disse o prefeito em vídeo nas redes sociais.
Em nota ainda na noite desta quinta, a direção da Bienal afirmara que não iria retirar os livros e que daria voz “a todos os públicos, sem distinção, como uma democracia deve ser”.
“Este é um festival plural, onde todos são bem-vindos e estão representados. Inclusive, no próximo fim de semana, a Bienal do Livro terá três painéis para debater a literatura Trans e LGBTQA+. A direção do festival entende que, caso um visitante adquira uma obra que não o agrade, ele tem todo o direito de solicitar a troca do produto, como prevê o Código de Defesa do Consumidor.”
A história, de Allan Heinberg e Jim Cheng, aborda a equipe dos Jovens Vingadores. Dela, fazem parte os personagens Wiccano e Hulkling – na trama, eles são namorados.
A edição, de 2016, era oferecida em “saldões”. A Salvat, que a publicou, não expõe na Bienal este ano.
Crivella manda recolher da Bienal livro dos Vingadores — Foto: Reprodução/Redes Sociais
A nota da prefeitura
A Prefeitura do Rio citou o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) para justificar “a adequação das obras expostas” – na quinta, Crivella falou em recolhê-las.
“A legislação determina que publicações com cenas impróprias a crianças e adolescentes sejam comercializadas com lacre (embaladas em plástico ou material semelhante), com a devida advertência de classificação indicativa de seu conteúdo”, diz a nota.
“No caso em questão, a Prefeitura entendeu inadequado, de acordo com o ECA, que uma obra de super-heróis apresente e ilustre o tema do homossexualismo a adolescentes e crianças, inclusive menores de 10 anos, sem que se avise antes qual seja o seu conteúdo”, emendou.
A prefeitura afirma que a editora, a Salvat, sabia da obrigação legal. “Tanto que a obra estava lacrada. Não havia, porém, uma advertência neste sentido, para que as pessoas fizessem sua livre opção de consumir obra artística de super-heróis retratados de forma diversa da esperada”, alegou.
A nota relata reclamação de frequentadores da feira, “que têm direito à livre opinião e opção quanto ao conteúdo de leitura de filhos e adolescentes, pessoas em formação”.
O texto rechaça ter havido “qualquer ato de trans ou homofobia ou qualquer tipo de censura à abordagem feita livremente pelo autor”.
“Em caso de descumprimento, o material sem o aviso será apreendido e o evento poderá ter sua licença de funcionamento cassada”, ameaça.
Fonte: G1
Por – Paulo Lima / CidadeAgoraNews